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Fortaleza da solidão é um calhamaço que se lê bem rapidamente. Apesar das mais de 600 páginas, a leitura se faz com muita fluidez.
O livro é dividido em duas grandes partes, entremeadas por um breve interlúdio.
Na primeira parte, a estória é contada em terceira pessoa. Dylan (como o cantor) é um menino branco que se muda com os pais para o um reduto negro no Brooklyn dos anos 1970. O pai é um artista de vanguarda, que em certo momento abandona a carreira, se obceca em fazer sozinho um filme de arte e, para pagar as contas, vira capista de livros de ficção científica, que nunca lê. A mãe, que some depois de alguns anos, é uma pós-hippie, deslocada no casamento e na sociedade.
Dylan é o único menino branco na escola e na vizinhança. O seu melhor amigo é Mingus (como o cantor de jazz), o vizinho negro, poucos meses mais velho, que foi também abandonado pela mãe, e que vive com o pai, Barrett Rude Jr, um cantor de soul music que nunca chegou realmente ao sucesso e que se entope de drogas em casa. Na mesma casa vai viver também Barrett Sr, pai de Junior e avô de Mingus.
A tragédia que envolve Mingus, seu pai e avô é contada no interlúdio entre as duas grandes partes.
Na segunda parte, a história muda de foco. Ao contrário de ser contada em terceira pessoa, é narrada – em sua maior parte – em primeira pessoa por Dylan. Passaram-se uns vinte anos. Dylan é um jornalista especializado em música, não muito bem-sucedido e que vive na Califórnia. Mingus foi para a cadeia, de onde saiu e depois voltou e depois saiu e voltou.
Bem, a segunda parte faz uma volta no tempo, até o momento após a prisão de Mingus e a ida de Dylan para a universidade, de onde é expulso depois de se envolver com o tráfico de drogas, quando da visita de um amigo do Brooklyn, Arthur.
A estória de Mingus também é contada, a tragédia com seu pai e avô e de como foi caindo cada vez mais no poço sem fundo das drogas.
Há também um elemento fantástico. Um anel com superpoderes. Na primeira parte, voo. Na segunda, invisibilidade.
O anel tem um papel importante no livro porque serve como resolução – mesmo que terrivelmente violenta – dos traumas causados em Dylan na infância pela presença de Robert Woolfolk, um outro garoto, que volta e meia aparece, sempre para surrar e roubar ou intimidar o protagonista.
Lethem escreve bem, mas com prolixidade irritante. É uma verborragia, especialmente na primeira parte que parece totalmente desnecessária. Parece que é um daqueles casos em que o escritor fica encantado com a própria escrita. Hipnotizado, diria.
Ele parece fazer parte de certo tipo de escritor americano – e poderia citar além dele, Donna Tartt, Jonathan Franzen, David Foster Wallace – que passou a acreditar em algum momento que o grande romance americano deveria ser, antes de mais nada, o volumoso romance americano.
É o caso desse Fortaleza da Solidão, que tenta ser um painel da geração que cresceu depois do Vietnã, em um Brooklyn, distrito de Nova York, decadente, sujo, corroído pela pobreza e pelas divisões raciais entre brancos, negros, latinos e em que a droga – maconha, cocaína, crack, ou qualquer outra – é um dos protagonistas, junto com a música.
Mas, enfim, há páginas demais. Não que o livro seja ruim. Não é, mas um corte substancial de páginas teria ajudado muito.
E as duas partes são desiguais. A primeira é um romance de formação, o pequeno Dylan passando de criança a adolescente. A segunda parte tem também elementos disso, mas temos também um Dylan mais velho, no final do século, com mais de trinta, que está sem rumo.
A segunda parte é melhor e gostei do reencontro de Dylan com o pai em uma convenção de ficção científica – capítulo 4 da segunda parte; muito bom. Gostei também da estória de Mingus, a sua terrível e crua descida no submundo do vício e do crime. Gostei, ainda, da visita que Dylan faz a Mingus na prisão e como o anel mágico resolve questões emocionais de maneira patética, mas trágica. Achei, porém, que a página final tenta fazer uma reflexão existencial, que busca uma espécie de entrelaçamento de todos os fios soltos na vida de Dylan, em que busca encontrar um sentido em tudo. Pareceu-me que ele perde um pouco a mão nesse ponto.
Enfim, vale a pena para conhecer um nome significativo da produção americana atual, mesmo que tenha alguns pontos complicados.
Uma nota final: deve ter sido um livro bem complicado para se traduzir, mas acho que a tradutora se saiu bastante bem.
Nota final dois: o título faz uma referência à morada do super-homem no pólo Norte, único local em que o homem de aço é sincero consigo próprio.
Nota final três: o livro é recheado de centenas de referência aos mundo pop - quadrinhos, cinema, televisão, literatura e principalmente música.
O livro é dividido em duas grandes partes, entremeadas por um breve interlúdio.
Na primeira parte, a estória é contada em terceira pessoa. Dylan (como o cantor) é um menino branco que se muda com os pais para o um reduto negro no Brooklyn dos anos 1970. O pai é um artista de vanguarda, que em certo momento abandona a carreira, se obceca em fazer sozinho um filme de arte e, para pagar as contas, vira capista de livros de ficção científica, que nunca lê. A mãe, que some depois de alguns anos, é uma pós-hippie, deslocada no casamento e na sociedade.
Dylan é o único menino branco na escola e na vizinhança. O seu melhor amigo é Mingus (como o cantor de jazz), o vizinho negro, poucos meses mais velho, que foi também abandonado pela mãe, e que vive com o pai, Barrett Rude Jr, um cantor de soul music que nunca chegou realmente ao sucesso e que se entope de drogas em casa. Na mesma casa vai viver também Barrett Sr, pai de Junior e avô de Mingus.
A tragédia que envolve Mingus, seu pai e avô é contada no interlúdio entre as duas grandes partes.
Na segunda parte, a história muda de foco. Ao contrário de ser contada em terceira pessoa, é narrada – em sua maior parte – em primeira pessoa por Dylan. Passaram-se uns vinte anos. Dylan é um jornalista especializado em música, não muito bem-sucedido e que vive na Califórnia. Mingus foi para a cadeia, de onde saiu e depois voltou e depois saiu e voltou.
Bem, a segunda parte faz uma volta no tempo, até o momento após a prisão de Mingus e a ida de Dylan para a universidade, de onde é expulso depois de se envolver com o tráfico de drogas, quando da visita de um amigo do Brooklyn, Arthur.
A estória de Mingus também é contada, a tragédia com seu pai e avô e de como foi caindo cada vez mais no poço sem fundo das drogas.
Há também um elemento fantástico. Um anel com superpoderes. Na primeira parte, voo. Na segunda, invisibilidade.
O anel tem um papel importante no livro porque serve como resolução – mesmo que terrivelmente violenta – dos traumas causados em Dylan na infância pela presença de Robert Woolfolk, um outro garoto, que volta e meia aparece, sempre para surrar e roubar ou intimidar o protagonista.
Lethem escreve bem, mas com prolixidade irritante. É uma verborragia, especialmente na primeira parte que parece totalmente desnecessária. Parece que é um daqueles casos em que o escritor fica encantado com a própria escrita. Hipnotizado, diria.
Ele parece fazer parte de certo tipo de escritor americano – e poderia citar além dele, Donna Tartt, Jonathan Franzen, David Foster Wallace – que passou a acreditar em algum momento que o grande romance americano deveria ser, antes de mais nada, o volumoso romance americano.
É o caso desse Fortaleza da Solidão, que tenta ser um painel da geração que cresceu depois do Vietnã, em um Brooklyn, distrito de Nova York, decadente, sujo, corroído pela pobreza e pelas divisões raciais entre brancos, negros, latinos e em que a droga – maconha, cocaína, crack, ou qualquer outra – é um dos protagonistas, junto com a música.
Mas, enfim, há páginas demais. Não que o livro seja ruim. Não é, mas um corte substancial de páginas teria ajudado muito.
E as duas partes são desiguais. A primeira é um romance de formação, o pequeno Dylan passando de criança a adolescente. A segunda parte tem também elementos disso, mas temos também um Dylan mais velho, no final do século, com mais de trinta, que está sem rumo.
A segunda parte é melhor e gostei do reencontro de Dylan com o pai em uma convenção de ficção científica – capítulo 4 da segunda parte; muito bom. Gostei também da estória de Mingus, a sua terrível e crua descida no submundo do vício e do crime. Gostei, ainda, da visita que Dylan faz a Mingus na prisão e como o anel mágico resolve questões emocionais de maneira patética, mas trágica. Achei, porém, que a página final tenta fazer uma reflexão existencial, que busca uma espécie de entrelaçamento de todos os fios soltos na vida de Dylan, em que busca encontrar um sentido em tudo. Pareceu-me que ele perde um pouco a mão nesse ponto.
Enfim, vale a pena para conhecer um nome significativo da produção americana atual, mesmo que tenha alguns pontos complicados.
Uma nota final: deve ter sido um livro bem complicado para se traduzir, mas acho que a tradutora se saiu bastante bem.
Nota final dois: o título faz uma referência à morada do super-homem no pólo Norte, único local em que o homem de aço é sincero consigo próprio.
Nota final três: o livro é recheado de centenas de referência aos mundo pop - quadrinhos, cinema, televisão, literatura e principalmente música.